Visão de golo é uma rubrica de opinião semanal assinada por Rui Águas, treinador e antigo internacional português
O dito jogo decisivo, por vezes não o é. É um hábito nosso, esta tendência para o estado de emergência do sim ou não. Em todo o caso, o jogo desta quarta-feira, com o Bayer Leverkusen, pode marcar uma diferente perspetiva para o Benfica nesta edição da fase de liga da UEFA Champions League. Uma entrada inesperada em falso, com o Qarabag, seguida de duas deslocações complicadas dificultaram as contas. Agora, enquadrar dois resultados consecutivos será o objetivo da equipa, considerando que o jogo seguinte, embora fora, é com um Ajax em dificuldades.
Inspiração coletiva precisa-se, bem como a força fundamental dos adeptos, já requisitada por Mourinho. Recuperar o orgulho na mais famosa competição europeia de clubes é a meta. A possibilidade de ultrapassar pontualmente este adversário é só mais uma motivação em jogo. «Encher o estádio, mas entrar em campo», foi a mensagem de Mourinho destinada aos adeptos. «Com alma e sem receio», a receita dirigida à equipa.
Conquista do castelo
A última vitória do Benfica em Guimarães era vista como fundamental, mesmo que em território agreste e difícil de vergar. A primeira parte foi uma amostra do espírito que o ambiente de Guimarães tradicionalmente transmite à sua equipa. Para além da atmosfera criada, a intensidade, agressividade e organização são sempre fatores que podem vencer jogos, mesmo que o adversário, como era o caso, seja teoricamente mais forte. O Benfica, que pareceu atordoado, mesmo avisado do tradicional espírito guerreiro local, viu o final do primeiro tempo chegar como se fosse um pedido seu.
Ao intervalo, as equipas que querem melhorar o seu jogo, não o conseguem só pela intervenção milagrosa dos treinadores. A paragem de jogo, só por si, para além do necessário repouso, já faz refletir os jogadores e, como foi o caso, quando as coisas não resultam, fica claro que algo de diferente tem de ser feito. Foi exatamente a expressiva palavra «forçar» que Mourinho reconheceu ter utilizado ao intervalo para mobilizar coletivamente a equipa. Não é o grito nem a quantidade de palavras que se dizem, mas o significado e a força que cada uma delas pode ter no espírito dos jogadores.
É verdade que Schjelderup e Barreiro entraram bem e que Sudakov e Prestianni não foram brilhantes, mas não foi só isso que inverteu o que acontecera no período inicial. O ter que ganhar, muitas vezes funciona como um travão, um estado ansioso que significa mais um obstáculo a transpor, para além da forte oposição vimaranense.
Cumprida a pausa regulamentar, e porque a necessidade aguça o engenho, o Benfica fez a verdadeira diferença logo no reinício do jogo. A um canto bem marcado por Lukebakio correspondeu Tomás Araújo, com um desvio em zona morta, entre a defesa e o guarda-redes vitoriano. Com as indefinições de uns, ganha a determinação de outros e com o ombro também vale... A variação é muitas vezes a chave nas bolas paradas, pela surpresa que podem representar. Otamendi e Enzo Barrenechea têm sido, normalmente, os mais solicitados. Nada como introduzir uma novidade para surpreender quem defende. O segundo golo não demoraria e com ele a antecipada resolução do jogo, ante um Vitória já diminuído. O último toque certeiro seria dado pelo jovem João Rego, em atenta recarga. Nada melhor para rematar uma noite feliz.
Em relação ao tempo de intervalo, cada equipa técnica tem o seu ritual, no qual naturalmente acredita. Há quem deixe um espaço inicial curto, para os jogadores descansarem e falarem em privado, ainda sem treinadores. Algumas equipas técnicas procuram, nesse período, reunir ideias e concluir qual o melhor discurso a utilizar para depois se conseguir o efeito pretendido. Penso ser um bom processo, mais cerebral e metódico. Mais do que qualquer alteração, até o silêncio pode ser diferenciador.

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