Treinador do Benfica fez esta segunda-feira a antevisão do jogo com o Rio Ave, mas conferência foi mais do que isso.
— Que adversário espera na Luz?
— Espero um adversário melhor que os pontos que conquistaram até agora. Observámos o Rio Ave e, principalmente nos três primeiros jogos, são muito melhor equipa do que aquilo que os pontos traduzem. Vê-se que é uma equipa que tem treinador, organização, que sabem aquilo que querem, têm alguns jogadores, para não dizer todos, com boa qualidade... vale o que vale, mas têm mais 24 horas a mais do que nós para preparar o jogo. Espero um jogo difícil, em que precisamos do fator casa, é ajuda importante. A equipa está a crescer, se taticamente tem de ser gradual, do ponto de vista emocional uma conexão com os adeptos para que se sintam em casa, adeptos que esqueçam que os dois jogos em casa não correram bem, e olhem com positividade para a equipa, seria uma empatia importante para defrontarmos o adversário.
— Há alguma coisa, na equipa ou em algum jogador, que o surpreende?
— Enquanto adversário, mais do que com o Benfica, fu honesto comigo próprio ao assumir que estava a jogar contra uma boa equipa, com bons jogadores. Obviamente que se formos comparar a primeira fase do Benfica, onde estavam os jogos da Champions, se compararmos com os últimos dois, três jogos, há ali, não direi um decréscimo de perfomance, mas há ali uma contradiçãozinha, mas o Benfica tem bons jogadores e tem coisas boas que vieram do passado. Não é minha intenção, mas se fosse à procura de coisas negativas do passado, não é fácil de encontrar, está aqui um trabalho bem feito por quem cá esteve. Mas nós, treinadores, somos todos diferentes e temos ideias diferentes. É importante que os jogadores abracem com alegria e confiança é sempre importante, porque quando se muda de treinador o que muda é o treinador que sai, mas os jogadores que ficam têm processo que muitas vezes não é agradável, tem de se adaptar, coisas novas... Posso enganar-me, terão de ser os jogadores a dizer, mas tenho a sensação, a cada dia, que eles estão a abraçar a minha maneira de trabalhar, de liderar, que estão a abraçar os conceitos que a pouco e pouco estamos a introduzir. Para mim, é uma coisa importante. Obviamente que enquanto grupo não somos ainda o grupo dos melhores amigos, conhecemo-nos há quatro ou cinco dias, mas acho que estamos a construir qualquer coisa de importante do ponto de vista humano. E depois, do ponto de vista da evolução tática da equipa, vamos à procura de ir pouco e pouco.
— Qual a principal dificuldade que tem sentido nestes dias de Benfica?
— A maior dificuldade é de facto o tempo, que não existe. Hoje e ontem já me libertei um bocadinho mais, mas nos dois primeiros dias... se os dias tivessem 48 horas continuariam a ser curtos, porque não é só o trabalho de campo com os jogadores, é o trabalho com uma estrutura, conhecer, as pessoas conhecerem-me, trocar ideias, coisas que são para manter e outras para mudar, essa foi obviamente a grande dificuldade. Relativamente à preparação do primeiro e do segundo jogo, foi tocar em pontos fundamentais, não exagerar na informação, porque processar informação pode levar a que o foco esteja ali e depois se perca alegria, liberdade de pensamento, criatividade e não quis exagerar a esse nível.
— É verdade que teve contatos com o Benfica ainda com Bruno Lage no cargo? É verdade que a sua contratação já estava projetada há algum tempo?
— A pergunta tem resposta fácil, mas é quase como que um apelo... se quiserem acreditar em mim, ótimo. Se não quiserem, não posso fazer nada para que não acreditem. Eu digo-vos a verdade. Podem dizer que é a minha verdade. Outros podem acreditar na verdade de outras pessoas, que se calhar foram intoxicadas com mentira. Ou preferem acreditar noutras pessoas, do que no Benfica ou naquilo que eu mais ou menos já disse, mas vou repetir, para que não fiquem dúvidas. No verão, eu não tive contacto absolutamente nenhum com o Benfica, com o presidente, com nenhum agente mandatado ou não mandatado. Nessa altura, Mário Branco [diretor-geral do Benfica e ex-diretor do Fenerbahçe] ainda não estava sequer no Benfica. Tinha contrato com o Fenerbahçe, e queria cumprir o contrato até ao final, e na minha cabeça estava longíssimo de pensar que poderia voltar a Portugal como treinador de clube. Sempre pensei que mais cedo ou mais tarde a seleção iria acontecer, poderia acontecer o Roberto [Martínez, selecionador de Portugal] ser campeão do Mundo, querer sair em grande e eu poder entrar, mas sem ter nenhum contacto com a Federação também, a minha carreira estava a ir um bocadinho nessa direção. Pensava que ia regressar a Portugal para treinar a Seleção. Tive zero contatos com o Benfica. É verdade que há anos, não consigo precisar, tive contatos com o Benfica, mas estava a treinar, tinha clube e as coisa se proporcionaram. Depois da entrada do diretor-geral [Mário Branco] e essa conexão que tentam fazer... Eu para me tornar grande amigo de uma pessoa que conheço no futebol, e só no futebol, é difícil. Se num ano construímos alguma coisa de importante é porque do outro lado estava uma pessoa séria, um profissional sério que depois, quando veio para o Benfica, e houve 25 por cento de possibilidade de nos encontrarmos com o Fenerbahçe, o nosso contato acabou. Não há mais. E não houve mais enquanto houve Fenerbahçe-Feyenoord, Benfica-Nice, Fenerbahçe-Benfica, Benfica-Fenerbahçe, zero contato. Quando o Benfica perdeu três pontos com o Qarabag, estava em Barcelona com a minha mulher e no dia seguinte, e nem foi o diretor-geral quem me ligou, foi o presidente que me ligou a perguntar: ‘mister, vale a pena conversarmos?’. ‘A decisão está tomada’, nem sabia que estava porque não tinha acompanhado no dia anterior, e disse-me: ‘gostava que fosse o mister a vir treinar o Benfica’; eu disse que claro que podemos conversar. ‘Quando é que vem para Portugal?’, vou para Portugal hoje, ao final do dia, vamos conversar. E acabou a história. Se quiserem acreditar em mim, ótimo, agradeço. Se quiserem, acreditar em fantasia, noutras coisas, alimentar uma história que não tem história, não posso fazer nada.
— Vimos Pavlidis e Ivanovic em tarefas diferentes na frente de ataque. Era uma das mudanças que sentiu ser preciso fazer?
— Cada jogo é um jogo, tem uma estratégia. Se há 20, 25 anos já tínhamos uma abordagem tática específica para cada jogo, imagine-se agora, com toda uma estrutura de apoio, análise, que nos permite ter mil informações e nos permite olhar para cada jogo como um jogo diferente. Não quis desvirtuar muito do que eles eram enquanto equipa, mas obviamente havia coisas, sem criticar... Eu gosto e quero coisas diferentes, portanto, sem desvirtuar muito, ou dar muita informação, principalmente sem ter muito trabalho de campo, porque acredito muito mais no trabalho de campo do que nas palavras e reuniões tático-estratégicas, obviamente que foram introduzidas algumas coisas. A maneira como saltamos na pressão, os timings da pressão, os movimentos ofensivos, a posse mais estabilizada, as situações de transição após recuperação, são coisas normais. De certeza que se fosse o Bruno [Lage] a ir para o meu lugar no Fenerbahçe também alteraria algumas coisas. Mas sim, tentei dar um bocadinho de uma dinâmica ofensiva diferente. Confesso que não os senti aos dois [Pavlidis Ivanovic] muito confortáveis a jogar num 4x4x2 flat, como se diz em Inglaterra, e pensámos em dar-lhe um tipo de ocupação de espaço que possa ter os dois confortáveis com aquilo que têm de fazer em campo. Sudakov também se integrou muito bem naquela dinâmica e, principalmente na segunda parte [do jogo com o Aves SAD], as coisas correram melhor.
— Da sua parte também houve um esforço financeiro da sua parte para treinar no Benfica?
— Mais uma vez ou acreditam, ou não acreditam em mim. Eu se ficasse em casa até ao final da época, ganhava mais do que a treinar o Benfica. É simplesmente assim. Se ficasse em casa até final da época, a usufruir da família, a visitar a família, a estar em Londres, a trazer a família para Portugal, a ir para o Algarve, a dar umas voltas por aí, ganhava mais do que vim ganhar para o Benfica. Ou seja, nem se pode dizer que estou cá grátis; estou cá... negativo. E dizem: porquê? Porque gosto muito de trabalhar, porque tinha saudades de jogar para aquilo que o Benfica joga. Tinha saudade de jogar para o título. Não pude jogar para o título na Roma, no Fenerbahçe. É uma oportunidade ótima para mim enquanto treinador, enquanto pessoa. Estar em casa não é para mim. Colocar-me à prova, correr riscos, estar sujeito a ganhar e a perder, a um dia ser muito bom e outro dia ser péssimo, são tudo coisas que me alimentam, me tiram da zona de conforto... Neste momento, a verdade é só uma: se ficasse em casa até julho, ganhava mais do que a trabalhar no Benfica, esta é a verdade pura.
— Como espera o ambiente no Estádio da Luz?
— Nos últimos anos fui várias vezes ao estádio em momentos bons, fui a Alvalade, ao Dragão, mas não gosto de ir nos maus momentos, só nos bons, e escondidinho lá em cima, uma box onde costumavam estar sempre os pais do António Silva, do João Neves na altura, gente tranquila... portanto, estou familiarizado com o que é o estádio. Queiras ou não aprendes as músicas, entram e fazem sentir, uns mais outros menos, mas são músicas bonitas e ritmadas. Não acredito que haja um único benfiquista no estádio durante o jogo que não queira ganhar. Tem de haver festa no princípio, apoio durante, no final de cada jogo, como disse aos jogadores, o Benfica ou ganha, ou não ganha, mas sai morto. Morto de cansaço, de fadiga, morto de tentar. E quando isso acontece, nos dias em que as coisas não correm bem, não correm bem para nós nem para as pessoas, porque elas enquadram-se reveem-se nesse comportamento. Perder como perdemos com o Qarabag, obviamente que as pessoas não se identificam com isso. Antes do jogo festa, durante o jogo apoio, e no fim do jogo festa, ou respeito por quem deu tudo e não tinha mais a dar.
— A sua voz [rouca] é reflexo da intensidade dos dias? E em quanto tempo terá a equipa pronta como deseja?
— Sim, é voz de trabalho. É a mesma coisa que o bronzeado de trabalho, na cara e nas mãos. É de passar informação constantemente, de estar numa fase em que os assistentes têm também de crescer com a equipa, em que tenho de conhecer cada vez melhor o Ricardo Rocha, que não trabalhava com ele, integrado n meu staff... estamos num período em que estou a assumir tudo. Depois, é reuniões de análise ao adversário, à nossa perfomance, falo muito, mas dois ou três dias e a coisa recupera. A equipa, quando acho? Nunca, porque isto está em permanente evolução. Na pré-época, dois treinos ao dia, depois dela, 50 treinos, mais meia-dúzia de jogos... este período não constrói uma equipa, constrói as bases, mas depois a situação é sempre porgressiva. Por exemplo, na preparação deste jogo há coisa do anterior que passam, que são transferidas, mas o Rio Ave joga diferente do Aves SAD. Mesmo que não joguem a cinco [defesas], joguem a quatro, os princípios serão os mesmos; são equipas diferentes e temos de nos adaptar. Agora, honestamente, acho que a empatia que estamos a criar entre nós, do ponto de vista humano e metodológico, acho que eles estão a aceitar muito bem e acho que isto pode acelerar o processo.
— Lukebakio pode ser opção? O que ele pode acrescentar à equipa?
— O Benfica, entre aspas o Benfica perdeu Akturkoglu [transferido] e Bruma [lesionado]. Precisava de um ala, que foi bem escolhido, dá opção de jogar na direita e na esquerda, obviamente que pela direita vai à procura de zonas mais interiores, na esquerda pode jogar mais aberto. Idade e experiência o mais equilibrado possível, está na idade perfeita de maturidade e equilíbrio, é jogador com grande potencial. Não estávamos à espera que pudesse jogar amanhã [hoje], estávamos a preparar só frente ao Gil Vicente, mas neste momento, com esta nova abertura que permite que possa ir a jogo [não estava inscrito à data da 1.ª jornada, mas Liga validou elegibilidade], nós retardámos a fase de preparação dele para o podermos ter neste jogo, sem entrar em estado exagerado de fadiga. Está no banco e se tiver de ir a jogo vai a jogo.
— O presidente do Fenerbahçe perdeu as eleições, como comenta?
— Honestamente passa-me ao lado. Se estou feliz com a não reeleição, estou; se tivesse ganho também não estaria. A minha vida ali foi pouco tempo e com pouca intensidade, empatia, pouca paixão. Pelos jogadores que ficaram, muitos deles, quase todos, com quem tenho ótima relação, que tudo lhes corra bem.
— Falou com Varanda e Villas-Boas [presidentes de Sporting e FC Porto], se o convite tivesse partido deles também aceitava?
— A pequena conversa que tive com eles foi muito simples, no sentido de eles, com sorriso ou emoji, ‘que tenhas muita sorte, mas que acabes em segundo’, é o normal. Se me perguntam se tivesse sido convidado pelo Sporting ou o Porto, teria aceite, honestamente não sei. Mas, com a velocidade e as condições com que disse sim ao Benfica, não.
— Já foi contactado ou conversou com alguns dos candidatos a presidente do Benfica?
— Não, não conversei, nem acho que o deva fazer. Foco no Benfica e na missão. Acho que presidente e Direções, de modo pragmático, são representantes dos milhões de adeptos do clube e é para esses milhões que um treinador deve trabalhar. Se fiquei agradado, se recebi com simpatia e até orgulho, o facto de candidatos terem proferido palavras de respeito quanto a mim, enquanto treinador, devo dizer que sim. Mas estou completamente isolado desse contexto. Quero dar o máximo cada dia, neste momento é Rui Costa quem está aqui todos os dias e foi ele quem deu o grande passo para me convencer a treinar no Benfica. Não sou importante. Voltei depois de uma série de anos, isto agora é normal, mas é coisa que se deve apagar com os dias, porque o foco e o que interessa é o Benfica.
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