Moçambique: Peditórios de partidos políticos são normais?



Em Moçambique, o novo partido ANAMOLA está a pedir publicamente, nas redes sociais, fundos para organizar as suas atividades políticas. Não comete nenhum crime, porém gera questões relativas à futura prestação de contas.


O novo partido Aliança Nacional para um Moçambique Livre e Autónomo (ANAMOLA) está a pedir publicamente, nas redes sociais, fundos para organizar o seu primeiro conselho nacional, a ter lugar de 21 a 22 de setembro na Beira, segunda maior cidade do país.


"Para organizar essa reunião, nós precisamos da vossa ajuda, o orçamento está muito elevado", apelou, recentemente, Venâncio Mondlane. "Até agora estamos a falar de cerca de 10 milhões de meticais [mais de 134 mil euros] só de orçamento para organizar esta grande reunião. Você sabe muito bem que precisamos da vossa ajuda- [...] só vamos ter uma conta nos finais de setembro."


Esta não é a primeira vez que os "venancistas" dirigem este tipo de apelos aos seus apoiantes, mas, sempre que o fazem, os seus detratores os olham de lado.


É um apelo "perigoso"


Será uma iniciativa inusitada? Dércio Alfazema, conhecido crítico do político Venâncio Mondlane, afirma que não, embora a considere perigosa. 


"São processos que não deixam clareza em termos de transparência, de como o dinheiro é recolhido, qual é a finalidade e o que é feito. Esses peditórios já acontecem há bastante tempo. É compreensível, porque é um partido novo que está a emergir, não tem membros", começa por dizer em declarações à DW. 


Contudo, Alfazema avisa: "Num contexto de branqueamento de capitais, onde existem grupos que têm interesses em controlar o Estado, pode ser um mecanismo para infiltrados que depois podem subverter o interesse do Estado e até pôr o partido numa situação de perigo."


Dércio Alfazema salienta que é preciso "transparência".


"O ANAMOLA já faz os peditórios há muito tempo sob vários pretextos, primeiro para comprar viaturas e depois para prestar assistência às vítimas das manifestações, e tudo isso nunca aconteceu. E os dinheiros são colocados em contas pessoais: Até há um risco de se poder estar a fazer contribuições em benefício próprio ou pessoal", adverte.




Esta não é a primeira vez que os "venancistas" apelam aos seus apoiantes, mas sempre que o fazem os seus detratores os olham de lado


Já a Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO, no poder) tem sido frequentemente acusada de exigir contribuições coercivas aos professores, descontadas diretamente da sua fonte de subsistência: o salário. Esse tipo de financiamento, sim, configura uma prática ilegal, refere Alfazema. "Já ouvimos casos de pessoas que já contribuíram avultadas somas para a FRELIMO, mas determinadas pessoas foram compreender que estavam associadas a crimes de tráfico de drogas, a negócios ilícitos", aponta.


Dércio Alfazema diz que é "compreensível quando se faz contribuições dentro dos mecanismos próprios para as contas dos seus partidos, e são os seus simpatizantes a fazer". No entanto, alerta que "cobranças coercivas de professores [e outros funcionários públicos] está totalmente errado As pessoas nem devem seguir esse caminho", vinca.


Lacunas na legislação

A Lei dos Partidos Políticos estipula apenas cinco formas de financiamento, uma delas as doações. Porém, a legislação é considerada lacunosa por ser permissiva a ilícitos.


Em 2024, o Centro de Integridade Pública (CIP) defendeu a "urgência de se reformular o quadro jurídico e institucional [...], especialmente em anos de eleições, justamente pelo volume de dinheiro e de outros fundos que se colocam a circular". É neste contexto que Dércio Alfazema defende uma maior prestação de contas, em nome da transparência, independentemente do partido.


"Vão demonstrar uma força fantástica de base. E as forças das bases é o que permite a vitória de um partido, a vitória política. Faço votos que os militantes do ANAMOLA consigam, cada um, contribuir um dólar por mês", acrescenta.

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